sexta-feira, 6 de agosto de 2010

BREVE COMENTÁRIO SOBRE O TEATRO BRECHTIANO

Por Nilton Santos

Depois do pós-guerra é certamente Brecht, cuja aparição torna-se importante na cena internacional do teatro, pela a forma de seu fazer teatral e pelo uso da estética, texto e pelo trabalho do ator com formação critica diante da encenação.

No período de entre guerras (1918-1940) o expressionismo alemão estava no auge de sua evolução, o exagero e o artificialismo são levados a cena na tentativa da exteriorização dos sentimentos, assim na pintura e no teatro o expressionismo desenhava a expressão do artista por meio de exaltação das emoções

Em contraponto neste contexto, é que surge a figura de Bertold Brecht, que através do racionalismo tentava impor uma visão mais comedida do sentimento, buscava como ferramenta para seu trabalho a lucidez e o raciocínio crítico na intenção de promover a ação do pensar e rever por uma ótica mais critica a concepção do mundo.

Neste momento no século XX, precisamente nas três primeiras décadas ruminava todo em questionamento político como suas revoluções e rebeliões impregnadas pelas a idéias. De Karl Marx, as experiências do socialismo na união soviética e comunismo como um todo estava bem observado na Europa, principalmente nos países do leste. As massas e o proletariado ganham um papel importante neste cenário racional de política social, que guiava o homem agir pela consciência de classe e é por estas idéias que Brecht pretende questionar o tipo de teatro reinante até então . Influenciado pelo o contexto social Brecht pretende escrever para as massas, obrigando assim a adotar um tipo de linguagem mais precisa, quase elíptica e direcionada a um revisionismo cientifico.

Brecht transforma diversos elementos que constituíam o teatro ocidental. Modificando os meios de representação e as temáticas do jogo cênico, destruindo a trajetória de sentimentos miúdos para construir a sociedade do amanhã .

Assim a teoria Brechtiana coloca o teatro diante de um problema, a qual o texto e a interpretação precisam adquirir uma visão enquanto elementos teatrais. O texto é questionado por BRECHT que busca sua função no conjunto cênico. Roubine comentando esta finalidade do texto em Brecht:

“Ele oferece de representar diversos significados, seja por oposição aquilo que o palco deixa a mostra, seja por sua adaptação, ou inadaptação a um público particular” ROUBINE. (1998. P.66)

Os assuntos de sua peças falam de temas sociais presentes no meio de relacionamentos do homem com o meio econômico e cultural assim seus textos trazem substancias significativas de lutas sociais o problema da infração , petróleo , família , religião e o comercio. Suas obras não são apenas para serem vistas no palco, mas -se importante no censobretudo para apreciação do expectador crítico, pois Brecht achava recomendável a leitura depois de vê-las, era a respeito um aprendizado por meio da arte. Assim Odete Aslam fala:

“O teatro é feito para que se aprenda algo com ele. Não convém mais mostrar nele os homens bons, mas inverossímeis e evocar soluções inaplicáveis. É preciso ajudar o homem a construir a sociedade” ASLAM (2005, P.120)

Na estética brechtiana as praticas do jogo cênico, consistem em fazer intervir em diversos meios da representação e do texto, para isso Brecht coloca na cena elementos que fortificava a idéia de texto cênico (slogans, projeções, inscrições, tabuletas) estes meios tem por finalidade romper a continuidade da ação deixando em isolado qualquer identificação com a personagem. Desta forma o teatro épico narra o que passou, deixando a ação presente para o teatro dramático.

A ação teatral em Brecht não se desenvolve como uma curva ascendente que culmina no desfecho. A ação é constantemente interrompida para que haja tempo necessário de refletir e invocar comentários ou contradições – descontextualizando a ação dramática.

Percebemos também em sua obra, partes de textos versificados, tanto no recurso da metrificação, quanto no verso branco. Segundo Aslam (2005) esse procedimento de alternância de prosa-verso dá a importância de oposição entre personagens, cria ruptura. Sobre o personagem brechtiano Roubine Argumenta:

“O que tem como resultado lembrar que o personagem não é uma imitação do real, mas uma simulação de uma objeto fictício” (2005, p.67).

Assim temos uma ruptura encaminhada por duas vertentes: uma que é dirigida pela a fala falada e outra pela a fala cantada, então nesta oposição a voz cantada comenta o discurso do personagem de forma irônica e critica.

Os elementos gráficos ou visuais do espetáculo têm a função de consolidar a base textual a linguagem escrita.

“Como vemos a novidade da pratica brecthiana tem a ver com a invenção de um texto plural, cuja heterogeneidade reforça as possibilidades significantes, através da dialética semiológica.”. ROUBINE (2005, P.67)

Estas ferramentas adotadas por Brecht tinham por natureza de função, criar a relação de consciência critica entre a arte e o expectador. Ele renuncia ao teatro de ilusão o encantamento preso por uma quarta parede, mas pretende com clareza organizar uma representação teatral com elementos destinados ao saber pensar.

De 1924 a 1926 escreve sobre a decadência do teatro convencional – o velho teatro (über den untergang as alten theatn) neste textos, fala do problema do teatro daquela época, sua função e seus efeitos, e analisa a relação com o público, pois acreditava que o teatro como se apresentava “estabelecia um contato cada vez menor com o expectador, por que já não significava mais nada para aquele público” TEIXEIRA (2003,P.25) abandona assim,toda tradição teatral, que ele considerava “esclerosada” ele vai beber inspiração na fonte das ruas, assistindo em loco a vida cotidiana, analisando o comportamento dos ambulantes e transeuntes, das pessoas comuns que transitam normalmente numa cidade. Renegando o herói aristotélico , fazendo uma troca de valor pelo o herói do proletariado, “no contexto de uma sociedade que é denunciada” ASLAM (2005,p.161)

O ponto inicial para a construção da cena brechtiana pode ser encontrada, facilmente nas ruas, como a exemplo um acidente. Nesta ação pode-se encontrar a testemunha ocular, que narra o acontecimento anterior para outras pessoas, porém este narrador não esta ligado emocionalmente ao fato, e assim não precisa sentir emoção em conta-lo, ele apenas efetua a narração demonstrando o acontecimento. Com base nesse principio Brecht incorporou esta forma de narrar para o palco, substituindo o “espetáculo de ilusões” sua intenção era retirar as surpresas para o expectador, deixando-o prevenido para o que vai se desenrolar na ação.

Para Brecht o publico ainda procura diversão no teatro, deste modo era preciso, e cremos que ainda seja, oferecer um outro tipo de diversão, que correspondesse aos anseios do público, sendo possível inserir a diversão no teatro sem que perdesse o senso critico.

As técnicas de encenação épica multiplicam os recursos significantes do espaço “ a dramaturgia brechtiana demonstra meridianamente o caráter enganador do debate que pretende contrapor o texto ao espetáculo” ROUBINE (2005,P.68 ) Nesta condição o teatro do significante se confronta ao teatro do significante da representação, do ator e da música. Brecht mostra que entre a idéia e a imagem cênica não existe incompatibilidade, “uma idéia só é legitimada teatralmente a partir do momento em que ela conseguiu visualizar-se” (idem).

Quando falamos em Brecht a primeira idéia de teatro épico que nos vem a mente é a técnica do distanciamento ou efeito v (verfremdungseffekt) falar de distanciamento´e entender o ator brechtiano em visualização de suas emoções. O ator épico se controla isso não que r dizer que representa friamente. O gente da cena épica deve ter o domínio de si e construir procedimentos artísticos exatos, para sugerir este ou aquele aspecto de sentimento, par logo mais significa-lo exteriormente de tal forma que o expectador não seja levado a um contagio sensível a sua revelia.

Segundo ASLAM 2005 o distanciamento brechtiano como fato de “dar-se o tempo para mostrar todas as faces de um objeto ou de uma situação” é fazer o ator diante de a situação mostrada atribuir sua reflexão e critica:

“Esse não envolvimento, não nos devem fazer cair num mal entendido infelizmente corrente. O fato de haver-mos traduzido o efeito V de Brecht por distanciamento, afastamento, tende, a fazer-nos pensar que tal efeito é sinônimo de indiferença”. ASLAM (2005, p70)

É de suma importância fazer justiça a comentários que ainda hoje são promovidos, por mera ignorância da obra de Brecht – um comentário freqüente é que a pratica pedagógica dava espaço para espetáculos frios e que a emoção era uma substancia que não cabia na montagem, segundo Roubine, “Brecht nunca parou de repetir que o teatro devia ser uma fonte de prazeres” (2005,p.167) e que por meio do prazer estético, a inteligência poderia escrever a dramaturgia de satisfação cênica..

Para propiciar o trabalho por meio dessa estética Brecht condena o principio de identificação com o personagem, porque vê nessa instancia um ofuscamento de mistificação de personagem.

Qual seria a característica de um ator épico? Como esse ator encara o seu papel diante da exposição personagem interprete? Berthold (2008) nos diz que o ator brechtiano não precisa renunciar a viver o seu papel, a diferença é que ele representa o seu personagem e se posiciona em relação a ele.

Berthold (2008) ainda afirma que não existem regras cristalizadas para configurar um distanciamento, nem sequer um conjunto de técnicas ou receitas que façam o ator a criar um padrão metodológico.

“Brecht chega assim a seguinte conclusão: é preciso inventar um outro ator, portanto novas técnicas de interpretação, ao mesmo tempo em que uma nova definição de suas tarefas no campo de interpretação” ROUBINE (2005, p.181)

Brecht em seu teatro recusa qualquer possibilidade de magia, pois acreditava este tipo de energia hipnotizava o espectador, um meio muito freqüente em que a magia pode mascará a visão do expectador, é no uso da musica na cena. A música para Brecht teria que corresponder à idéia de texto e dessa forma desempenhar um papel enquanto dramaturgia, mais sempre de maneira critica.

“Na representação épica a musica intervirá com efeito exibindo-se música de teatro. Se for o caso, ela hesitará em citar-se a si mesma, em pegar emprestadas certas formulas que remetem a formas tradicionais familiares, conhecidas do expectador: ópera, o Cabaré, o circo.” Idem (2005, p.161)

Num plano distante de desenhar uma atmosfera da ação. A musica do teatro épico tem a função de marcar as quebras para proclamar o espetáculo como manifestação teatral. Em alguns de seus espetáculos a musica surge como espécie de números isolados, alguns deles com a presença de orquestra no palco, com iluminação especial para cada número, fazendo também uma espécie de distanciamento. Este evento pode ser designado pela colocação dos cantores que podem estar de fronte para o público. “A música tem a função de ironizar, de propor um comentário autômato de emanar os outros elementos” (idem).

A música em Brecht configura uma função diferente do teatro mais convencional qual era conhecido até então. No teatro épico a musica age interrompendo a ação, rompendo a unidade de imagem, criando oposição ao personagem, mostrando a contradição do mesmo – afastando qualquer aproximação com o real.

A arte do teatro no século XX ampliou horizontes históricos com suas vanguardas e conceitos. A abertura geográfica possibilitou a circulação de companhias e disseminou técnicas que contribuíram para uma nova visão de teatro – o teatro da criação. Brecht por sua vez adotou novas praticas para falar do espetáculo. É notória sua aparição e sua importância para o teatro ocidental. Sua estética épica colocou o ator diante de um posicionamento critico e sua arte falava para as causas sociais, para massa e ao mesmo tempo como dizia o próprio Brecht: “O teatro é o ensaio da revolução”.

Essas experiências, esses conceitos, num encontro de idéias e praticas infinitivamente amplificadas a estranhamento cênico, tiveram sobre a própria apreciação do ator uma influência que não pode ser subestimada, ainda que se faça muita contradição sobre o deixado brechtiano.

O fenômeno do teatro brechtiano, justamente se deu sob influência marxista, que pode parecer natural para a época, e é na realidade o resultado de uma mudança de paradigma no mundo político, talvez este tenha sido o único momento na historia da civilização, em que a ordem social e econômica caminhava por outro caminho, dentro de um horizonte, a qual o homem não precisasse de moletas para andar , e desta mesma forma que o teatro de Bertold Brecht surgia na Europa dos anos 30.

REFERÊNCIAS:

ASLAN, Odete. O ator no Século XX: Evolução da Técnica, problema da ética – São Paulo: Perspectiva, 2005.

BERTHOLD, Margot. Historia mundial do teatro, 4ºed – São Paulo: Perspectiva, 2008.

ROUBINE, Jean-Jacques. A Linguagem da Encenação Teatral, 2ºed – Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998.

TEIXEIRA, Francimara Nogueira. Prazer e Critica: O Conceito de Diversão no Teatro de Bertold Brecht – São Paulo: Annablume, 2003.

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